Celebramos hoje quatro de Outubro, 21 anos após a
assinatura dos acordos de Paz, que tiveram lugar na capital italiana Roma, em
1992, entre o governo da FRELIMO e a RENAMO (então grupo de guerrilha).
Este acordo de Paz, deixa um grande marco na vida dos
moçambicanos depois de 16 anos de conflito interno opondo os dois beligerantes
acima mencionados, que para além de perdas humanas, teve profundas implicações
na estruturara económica e social do país. Várias são as evidências
consequentes deste dramático e triste período em Moçambique, desde
intra-estruturas destruídas, emigrações forçadas, delinquências, etc., no
entanto, no dia quatro de Outubro de 1992, importou ao povo moçambicano, a
união entre as partes, com o cessar-fogo verificado e os olhos postos para
frente com vista a reconstruir o país praticamente em ruínas, não tendo por
isso interessado quem era o culpado, mas acima de tudo a estabilidade e a boa
convivência entre os moçambicanos a todos níveis.
E a Paz não demorou dar frutos, tendo dois anos depois, Moçambique
assistido as primeiras eleições multipartidárias, que por sua vez marcaram a
abertura e construção de um novo panorama político, com fortes sinais de um
regime democrático embora embrionário, mas bastante promissor com o surgimento
de diversas formações políticas e organizações da sociedade civil, para além do
renascimento económico e social.
Passados 10 anos após a assinatura dos acordos, a Paz
continuava intacta e bastante longe de ser ameaçada, com um cenário político
embora bipartidário, porém relativamente competitivo e plural, alias por volta
dos anos 2000 as cessões parlamentares transmitidas pela televisão, atraiam
maior audiência a nível da esfera social moçambicana, talvez até não tanto pelo
interesse dos assuntos lá discutidos, mas sobretudo pelo cenário caracterizado
por debate.
Entretanto, celebramos hoje 21 anos de Paz, como se nada
tivesse acontecido, apesar das feridas eternas deixadas pela guerra dos 16 anos
a milhares de moçambicanos. São hoje 21 anos de Paz, mas ao mesmo tempo 21 anos
de profunda incerteza.
Moçambique regista neste momento um crescimento económico
digno de realce, com investimentos de grande envergadura e uma infra-estruturação
invejável em quase todos pontos do país. Contudo, a saúde de um sistema político,
depende da interligação dos seus elementos, o que em Moçambique não está
acontecendo, pelo que o sistema funciona como um electrodoméstico/aparelho
completamente desnorteado.
Para além da incapacidade do actual executivo em transformar
as mais-valias do crescimento económico em bens e serviços para o todo povo
moçambicano, resultando no recrudescimento da pobreza urbana caracterizada
essencialmente por altos índices de desemprego, criminalidade e falta de habitação,
o país vive hoje momentos de incerteza no que diz respeito a estabilidade e
segurança no seu todo. 21 anos de um ser humano, é sem dúvida uma vida, mas 21
anos de cessar-fogo/Paz é bastante pouco, mas muito pouco para ser ameaçada. Infelizmente
já está acontecer em Moçambique, com suposto diálogo entre os dois maiores
partidos moçambicanos, que se arrasta a mais três meses, com vista a resolver a
actual tensão política que já criou vítimas mortais e danos incontáveis com o condicionalismo
que se verifica na região de Muxungue, na província de Sofala.
É como muita tristeza que acompanhamos dirigentes falando
de salvaguardar a Paz como o bem mais precioso dos moçambicanos, no entanto, na
realidade assistimos por um lado, aquisição de novo material bélico, movimentação
de militares de um lado para outro e perda de compatriotas em confrontos com
militares da RENAMO, e por outro, uma polícia moçambicana cada vez mais
violenta e arrogante com o seu próprio povo. Que tipo de Paz se pretende
construir neste cenário?
Se quisermos esquematizar, diríamos: Independência - Conflito/Pobreza - Paz/Estabilidade - Pluralismo/Crescimento
– Tensão Social e Política – Conflito
Será que falta no actual executivo sabedoria suficiente em
accionar mecanismos estratégicos para ultrapassar a actual tensão e ao invés de
um conflito alcançarmos prosperidade? Questiono porque efectivamente não tenho
a resposta, mas certeza tenho de que a Paz não está de boa saúde e que Moçambique
vive momentos conturbados e de bastante incerteza.